O professor de educação física Marcio Atalla está à frente do Projeto Vida de Saúde, que propõe mudar a qualidade de vida de uma cidade inteira (Jaguariúna, a 120 km de São Paulo) por meio da prática de atividade física e melhores escolhas na alimentação. Especialista em treinamento de alto rendimento com pós-graduação em nutrição pela USP, Atalla dá sugestões de como ser mais ativo no dia a dia e perder o excesso de peso.
As pessoas estão cada vez mais gordas, no Brasil e no mundo. Qual a relação que você vê entre o aumento dos índices de obesidade e o fato de todos estarem se movimentando menos?
Marcio Atalla – Não tenho nenhuma dúvida de que essa é a principal causa. Associar o excesso de peso da população à alimentação é um erro. Você não vê nenhum estudo comparando a quantidade de calorias consumidas nos último 50 anos e agora que mostre um aumento significativo no número de calorias. Mas se pegar qualquer estudo dos últimos 30 ou 40 anos mostrando a quantidade de movimento que o ser humano deixou de executar no dia a dia e chegamos a uma redução de 70% a 80% de movimento atualmente por conta de mais tecnologia, mais conforto. O fato de o ser humano não estar se movimentando impacta diretamente no aumento da obesidade.
E qual é o mínimo de atividade física que alguém que está sedentário e acima do peso deve que fazer para emagrecer?
Marcio Atalla – Isso varia caso a caso. É muito importante observar como é o dia da pessoa e ver que tipo de movimento ela pode incluir com regularidade. Não importa qual é a atividade física ou o tipo de movimento, ela só vai colher esses benefícios se ela fizer sempre. Pode ser subir escadas todos os dias, caminhar. Com meia hora de caminhada moderada por dia já dá para colher os benefícios da atividade física, de um gasto calórico maior. Só para ver essa relação, estudos mostram que se você substituir duas horas do seu tempo sentado simplesmente pelo tempo em pé você já tem aumento do gasto calórico, diminui os riscos de problemas cardíacos e de diabetes. Então o fato é diminuir o tempo de inatividade, que fica sentado ou deitado. Você decide como vai mudar isso. Mas tem que ter regularidade.
Regularidade é “todo dia”?
Marcio Atalla – Pelo menos cinco vezes na semana. Regularidade é a maior parte dos seus dias. Se o mês tem 30, você tem que se movimentar pelo menos 20, 22, 23 dias para que o seu corpo entenda que o dia que você não se movimenta é uma exceção, não a regra.
Qual a participação da alimentação nesse processo?
Marcio Atalla – Claro que a boa alimentação é importante. Mas isso tem que estar adequado ao estilo de vida de cada um. A pessoa que faz mais movimento, que leva uma vida mais ativa e mais saudável vai ter uma liberdade maior na hora da alimentação. Quem é sedentário, que não se movimenta muito, não pode errar na alimentação e acaba tendo um cardápio muito restrito. Por isso é importante equilibrar. Sempre sugiro consumir entre 60% e 70% de alimentos in natura (frutas, legumes, arroz, feijão, carne, ovos, laticínios) porque vai ter mais fibras, mais nutrientes, e colocar o corpo em movimento. A atividade física tem uma série de respostas no corpo que nenhuma alimento vai proporcionar. Mas a alimentação complementa.
Quais seriam, por exemplo, três maneiras de colocar mais movimento no dia a dia?
Marcio Atalla – 1 – A primeira coisa é diminuir o tempo sentado ou deitado. Se você trabalha muito tempo sentado, procure ficar mais tempo em pé. Na hora de falar ao telefone, por exemplo.
2 – Faça pequenos deslocamentos no seu dia, como trocar o elevador pela escada. Na hora do almoço, vá caminhando até o restaurante. Tudo isso conta.
3 – Escolha uma atividade física que dê prazer. Isso é fundamental porque, tendo prazer, você vai conseguir ter regularidade e vai colher outros benefícios que não só físicos da atividade.
Se a pessoa optar por subir escadas, quantos andares deve subir por dia para ver resultado?
Marcio Atalla – Isso vai sempre depender do nível de condicionamento físico de cada um. Se você subir 18 andares ao longo do dia (não precisa ser de uma vez: pode dividir em seis ou oito vezes) vai colher os benefícios de uma caminhada de 30 minutos.
E a história de contar passos: quantos passos preciso dar para deixar de ser sedentário?
Marcio Atalla – O ideal é dar 10 mil passos todos os dias. Com 7500 você deixa de ser “sedentário” e passa a ser “pouco ativo”. Com 10 mil passos você já é “ativo”. Hoje, o brasileiro dá, em média, 2200 passos. Se você chega a 7500 já está diminuindo em 60% o risco de ter diabetes e problemas cardíacos. É um passo por vez: de 2200 sobe para 7500, depois procura atingir a meta de 10 mil passos cinco vezes por semana.
Como você pretende ajudar a melhorar a saúde de uma cidade inteira?
Marcio Atalla – No início do projeto, em maio, parte significativa da população de Jaguariúna foi cadastrada e passou por avaliações laboratoriais: exame de sangue, circunferência abdominal, IMC (índice de massa corporal), pressão arterial, nível de atividade física, padrão alimentar e estado de saúde. Estamos fazendo uma série de intervenções na cidade, oferecendo várias oportunidades para as pessoas se exercitarem e aprenderem a comer melhor: caminhadas, passeios de bicicleta, oficinas de culinária e de nutrição, palestras e aulas abertas nos parques públicos. Os cadastrados têm acesso a uma plataforma digital chamada “Oi, Atalla!”, que permite que as pessoas simulem treinos, anotem todas as suas atividades diárias e recebam dicas de nutrição e atividades físicas. Além disso, há um aplicativo de celular com pedômetro, que marca quanto o usuário está se movimentando por dia. No final do ano refaremos os exames para medir o real impacto da mudança do estilo de vida na saúde dessas pessoas e os dados servirão de base para um estudo científico coordenado por mim junto com pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) e da Faculdade de Jaguariúna (FAJ).
Então a ideia é replicar isso em outras cidades?
Marcio Atalla – Sim. O modelo do Vida de Saúde pode e deve ser replicado em diversas cidades do Brasil. O objetivo do projeto é mostrar que atitudes como as citadas já promovem benefícios a saúde. Fazer pequenos ajustes na alimentação também contribui bastante, sem a necessidade de manter uma postura radical ou seguir dietas impossíveis. Construir saúde não acontece de uma hora para outra, é um processo de reeducação de hábitos. A ideia é fazer um pouco a cada dia, mas todos os dias. E usar a medicina preventiva mais barata e eficiente que existe e que pertence a cada um de nós: o movimento.